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2011 Ano da Itália no Brasil
quarta-feira, 8 de dezembro de 2010
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A cultura italiana é parte da raiz do povo brasileiro. Esta história começou com a intensa imigração do povo da Itália para o Brasil na segunda metade do século 19, que, com seus descendentes introduziram costumes no país na mesma medida em que também se adaptaram à cultura local. Esta mistura repercutiu em diversos setores: do trabalho manual ao intelectual, no campo ou na cidade.
A vinda de imigrantes europeus à América foi favorecida pelo empenho da Inglaterra, superpotência do século 19, em disseminar o liberalismo pelo mundo. E na lógica da livre concorrência, não cabia o trabalho escravo, mas sim o assalariado operário capitalista, mesmo que o salário em questão fosse irrisório. Para isso a Inglaterra fez uma forte pressão pelo fim do tráfico negreiro.
O Brasil, uma das principais colônias escravistas, onde os negros africanos impulsionaram as economias do açúcar e da mineração, sentiu o peso desta pressão. Embora tendo o trabalho escravo se estendido até 1888, o fim da “importação” de africanos impactou a demanda de trabalhadores. E a falta de mão-de-obra no início do ciclo do café levou o governo paulista a subsidiar a vinda de imigrantes europeus para trabalhar nos cafezais. O restante da Europa, por sua vez, sofria com o alto crescimento demográfico, com crises e desemprego, o que fez muitos de seus filhos debandarem. Neste quebra-cabeça internacional a propaganda da imigração foi peça chave. Cartazes espalhados, sobretudo nos países europeus mais afetados, como a Itália, anunciavam prosperidade à oeste do Atlântico e seduziam os nativos do clima temperado a iniciar nova vida. Foi a deixa para que milhares de europeus desiludidos fizessem suas malas e embarcassem nesta que foi uma das maiores aventuras da história: a imigração para as Américas.
Estima-se que entre 1870 e 1970 cerca de metade da população italiana, algo em torno de 28 milhões pessoas, deixou sua terra natal. No Brasil entre 1882 e 1934 4.5 milhões de imigrantes italianos chegaram pelo Porto de Santos. A economia do café era o atrativo para estes trabalhadores. E o café mudou a configuração do país gerando riqueza, fomentando a construção de ferrovias e a industrialização, principalmente em São Paulo e Rio de Janeiro.
Mas o governo paulista tinha intenções escusas além de mão de obra para a lavoura. O incentivo para a vinda de italianos contemplava também o projeto de “branqueamento” da população brasileira, marcada, naquela época, pela mistura entre o índio, o negro e o português. Respaldado pelo pensamento científico, tal ideário racista e discriminatório ocorreu em vários países do mundo, entre final do século XIX e início do século XX. Segundo as teorias de darwinismo social e eugenia racial, incorretas, como foi provado depois, os brancos eram mais hábeis em promover o avanço do país. Por isso era interessante atrair famílias européias inteiras, para que elas disseminassem sua cultura e seus genes por aqui.
No Brasil os italianos se estabeleceram, sobretudo na região sudeste, nos arredores das plantações de café e das Estradas de Ferro do Norte e da São Paulo Railway. Ao chegarem em São Paulo eles se acomodavam na Hospedaria de Imigrantes (construída em 1908) onde obtinham dormitórios, refeições e atendimento médico por até oito dias, até o encaminhamento aos trabalhos.
Cada família podia comprar seu lote de terra nos núcleos coloniais. Segundo a revista O Immigrante (jan/1908 – Arquivo do Estado de SP) em 1908, cerca de 2000 famílias habitavam os lotes paulistas nas colônias: Sabaúna, de italianos e espanhóis; Campos Salles, de alemãs, austríacos, italianos, suíços e escandinavos; Pariquesassú, de polacos, austríacos, alemães e portugueses e o núcleo Nova Odessa, de russos. Todas às margens da estrada de ferro.
Tanta política escondia um lado perverso. O longo prazo de cinco ou dez anos para o pagamento pelo lote, atrelava os imigrantes aos patrões. Além disso, nas plantações de café trabalhavam homens, mulheres e crianças. Os fazendeiros, acostumados com a escravidão, submetiam os imigrantes ao ritmo de trabalho dos escravos. Ao tomar conhecimento da situação o governo da Itália, pos um fim na imigração subsidiada de italianos para o Brasil.
Sem o subsídio a imigração diminuiu muito, mas continuou intensa até a década de 1920, quando o ditador nacionalista Benito Mussolini, passou a controlá-la. A declaração de guerra do Brasil contra os países do eixo, após a Segunda Guerra Mundial e a Lei de Cotas de Imigração, de 1934, do presidente Getúlio Vargas foram outros fatores de decadência deste processo. Mesmo assim ao fim da II Guerra, em 1945, ainda entraram 106.360 italianos no Brasil encerrando este grande fenômeno migratório.
A essa altura a comunidade italiana incorporara-se nas entranhas do Brasil. Tal incorporação se deu conjugada com o crescimento de São Paulo, que entre 1930 e 1980 passou de 130 km2 para 900 km2 de extensão e multiplicou por treze sua população, que passou de um para treze milhões de habitantes. Este casamento não é mera coincidência, uma vez que os italianos participaram ativamente do processo de urbanização da cidade, migrando da agricultura para a indústria e, posteriormente, para o setor terciário de acordo com o ritmo da cidade.
A cultura italiana se reflete na comida, ns festas, no sotaque, na introdução de novas técnicas agrícolas. Mas, mais do que isso, os imigrantes trouxeram em suas bagagens ideologias operárias e influenciaram na formação dos sindicatos e de partidos políticos no Brasil. O ano da Itália no Brasil é um bom momento para fazermos uma revisão desta história.
Milton Baptista de Souza (Cavalo) é Secretário de Cultura e Memória Sindical da Força Sindical, Presidente do Centro de Memória Sindical e Diretor Tesoureiro do Sindicato dos Metalúrgicos de Osasco e Região