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Todos juntos contra os juros altos!
sexta-feira, 21 de outubro de 2011
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É necessário aproveitar o momento de crise internacional a nosso favor e dar uma “paulada” na SELIC, trazendo-a dos 11,5% para algo em torno de 8 ou 9%. Os únicos prejudicados serão os detentores de capital especulativo, que vêm para cá em busca de rentabilidade elevada e segura, sem nenhum compromisso com a economia brasileira.
Paulo Kliass
Para quem está habituado a acompanhar a cena política brasileira, a iniciativa pode até parecer um tanto bizarra. Afinal, o auto intitulado “Movimento por um Brasil com Juros Baixos: mais Produção e Emprego” se constitui de um amplo arco de aliança de forças políticas. A iniciativa coube a várias entidades do movimento sindical (como a CUT, a Força Sindical, entre outras) e do movimento empresarial (como a FIESP, a ABIMAQ, por exemplo), e com o passar dos dias a adesão tem aumentado de forma significativa. [1]
No entanto, tal fato só deve soar estranho para aqueles que carregam consigo um pseudo “principismo” na forma de fazer política e se recusam a qualquer tipo de unidade na ação com parceiros que podem ter diferentes visões de mundo e de projetos para o nosso País. Na verdade, o que mais chama a atenção no caso é a impressionante demora em se ter articulado um movimento de tal envergadura por uma cau sa que consegue unificar um conjunto vastíssimo de setores sociais aqui no Brasil e no resto do planeta. Há décadas a política monetária levada a cabo pelos sucessivos governos teve a marca da ortodoxia extremada e a manutenção das taxas de juros mais altas em todos os continentes. O sacrifício imposto à grande maioria dos setores da sociedade tem sido imenso.
No discurso, todo mundo se dizia contra tal aberração, com exceção dos representantes do capital financeiro e seus porta-vozes espalhados, de forma estratégica, pelos órgãos da grande imprensa. Cavalgando tranquilamente na trilha hegemônica aberta pelo neoliberalismo, eles conseguiam calar as vozes dissonantes e inviabilizar que propostas alternativas fossem sequer cogitadas de implementação como política econômica. Porém, os empresários do setor produtivo – apesar de serem prejudicados por tal política – não se dispunham a colocar suas forças em ação de forma mais aberta e mobi lizadora contra a política monetária, pois talvez se sentissem um tanto incomodados em assumir tal postura perante o governo e a sociedade.
Já uma parte das entidades do movimento sindical se recusava a qualquer forma de mobilização nas ruas contra a política monetária, com a desculpa equivocada de que não poderiam ir contra aspectos da política de um governo de cuja base de apoio faziam parte. E assim foi o longo período do reinado absoluto dos juros altos, provocando a maior transferência de recursos públicos para o setor financeiro privado de nossa história, sob a forma dos juros e serviços da dívida pública.
E aqui também foi necessário que eclodisse a crise financeira de 2008 e suas recaídas mais recentes para que tais entidades resolvessem tomar atitudes mais ousadas. Pegando carona nos movimentos de revolta como “los indignados” e “occupy Wall Street”, as entidades começam a ensaiar timidamente alguns passos aqui em n ossas terras. Mas só assumiram algo mais efetivo depois que o COPOM promoveu a redução da SELIC na reunião de agosto de míseros 0,5%. E agora outra redução quase irrelevante de mais 0,5%, na reunião de outubro, exatamente como previa a pesquisa do Banco Central junto aos operadores do mercado financeiro.. Sem querer desmerecer a importância política do movimento, é importante registrar que até parece terem resolvido assumir uma postura mais ofensiva apenas depois que a Presidenta Dilma deu sinais que desejaria mesmo juros mais baixos.
A primeira manifestação de lançamento do movimento foi carregada de simbolismo. As entidades se dirigiram à sede do Banco Central na Avenida Paulista para demonstrar seu descontentamento com a política monetária de juros tão elevados. No coração da cidade de São Paulo, em meio a edifícios de bancos, de grandes multinacionais e da própria Federação das Indústrias, foi deixado o registro de um movimento que b em representa a amplitude da evidente discordância reinante no interior da sociedade brasileira a respeito dos juros estratosféricos.
Porém, se o objetivo das entidades é realmente trazer a taxa SELIC para níveis – digamos – mais “razoáveis”, então será necessário avançar ainda bastante na capacidade de mobilização e intervenção na arena política e nas ruas. Parcela significativa dos economistas não comprometidos com a banca já tem se manifestado a respeito da urgência em se estabelecer uma política de juros reais (taxa oficial deduzida a inflação) bem mais reduzida. Hoje ela continua em torno de 6 % ao ano, enquanto a maioria dos países desenvolvidos pratica níveis próximos a zero ou mesmo negativos.
Assim, é necessário aproveitar o momento de crise internacional a nosso favor e dar aquilo que o jargão do financês chama de “paulada” na SELIC, trazendo-a dos 11,5% para algo em torno de 8 ou 9%. Os únicos prejudica dos serão os detentores de capital especulativo, que vêm para cá em busca de rentabilidade elevada e segura, sem nenhum compromisso com a economia e a sociedade brasileiras. Todos os demais setores serão beneficiados por tal mudança. O Estado deixará de comprometer volumes criminosos de recursos orçamentários para sustentar o parasistismo, passando a investir mais na saúde, educação e outras áreas prioritárias. A taxa de câmbio sairá desse patamar de valorização do real frente às moedas internacionais, propiciando maior competitividade às nossas exportações de manufaturados e reduzindo o nível absurdo de importações de produtos industrializados. Com isso, poder-se-ia iniciar, de forma efetiva, um processo de reversão da atual tendência à desindustrialização, com a qual perdemos emprego e renda para o resto do mundo.
Se não existem mais tantas barreiras políticas e ideológicas à redução dos juros, cabe à sociedade organizada faze r valer sua voz e seus interesses junto ao governo. E a história recente tem demonstrado que apenas a mobilização objetiva funciona como elemento de pressão. Cada vez mais fica evidente para a população a balela em que se transformou o dogma, até anteontem intocável, da “independência do Banco Central”. Na verdade, esse foi o recurso de retórica utilizado para permitir que a autoridade monetária operasse de forma absolutamente “dependente” do sistema financeiro. E, pior ainda, fazendo com que o conjunto do governo e do sistema político se tornasse refém de seus interesses. Não adianta apontar apenas para o horizonte longínquo de 2012, como chegaram a ensaiar alguns oradores do movimento no dia 18 passado. A mudança é urgente! Caso fiquemos esperando o ritmo de queda de 0,5% a cada 45 dias, aí sim mais uma vez perderemos o bonde da oportunidade histórica de uma queda substantiva. Foi o erro cometido em 2008, fato reconhecido até por integrantes da atual equipe econômica
É necessário ampliar o movimento para focar já na próxima reunião do COPOM de 29 e 30 de novembro, com exigências de níveis bem objetivos de meta de taxa SELIC desejada. Há muito espaço político ainda a ser preenchido com entidades que até agora não demonstraram envolvimento que a causa merece, como UNE, UBES, MST, OAB, CONTAG e tantas outras. Ampliando essa base e sensibilizando a população a se mobilizar a favor da medida, o movimento terá 45 dias para trabalhar o conjunto da sociedade, de forma a convencer a Presidenta e sua equipe de que outro patamar de taxas de juros é possível!
NOTA
[1] Ver: http://www.brasilcomjurosbaixos.com.br/
Paulo Kliass é Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental e doutor em Economia pela Universidade de Paris 10.