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A inserção dos trabalhadores negros nas indústrias químicas do Estado de São Paulo
sexta-feira, 12 de agosto de 2016
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Dados do PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) de 2014, que mostram que no Brasil a população negra correspondia a 53,63% do total de residentes no país, e que no estado de São Paulo o percentual equivalia a 37,25% da população, exemplificam que esses mesmos percentuais pouco se aplicam em relação à inclusão social de negros e suas famílias, no que se refere a uma distribuição geral nas mais diversas instituições sociais, tornando nítidas as consequências da herança histórica de marginalização e exclusão nos circuitos de inclusão social, escolarização, formalização da mão de obra e das instâncias de decisão e poder.
Um cenário que se apresenta ainda mais emblemático pelo seguinte contraste: apenas 12% das 4,1 milhões de pessoas com ensino superior completo no estado de São Paulo são negras, em contrapartida, no mesmo estado, conforme o Sistema Integrado de Informações Penitenciárias (InfoPen/2010), 46,4% das 163 mil pessoas encarceradas são negras.
Consciente desta realidade, e na luta pela erradicação da discriminação racial, que é por vezes, velada no nosso dia-a-dia, mas que está explícita nas mais diversas estatísticas, o Departamento de Promoção da Igualdade Racial da FEQUIMFAR, coordenado pelo companheiro Francisco Quintino, encomendou à subseção do DIEESE na entidade, um estudo elaborado com base na RAIS (Relação Anual de Informações Sociais) de 2014, para identificar as distorções e iniquidades de caráter racial existentes no mercado de trabalho formal da indústria química do estado de São Paulo.
Logo de início, ao olhar a participação da população negra empregada na indústria química do estado de São Paulo em 2014, e considerando um universo de 394.083 trabalhadores (as), verificamos que somente 92.939 (23,6%) destes são negros (as), sendo 18,5% classificados (as) como de cor parda e 5,1% como de cor preta, lembrando que, conforme a classificação do IBGE é considerada como negro os classificados como pretos e pardos, e não negros as demais etnias.
No setor industrial de fabricação de álcool/etanol e biocombustíveis a presença de negros (as) alcançou a maior participação com um percentual de 32%, enquanto que nos segmentos de fabricação de defensivos agrícolas, fibras artificiais e sintéticas e produtos farmacêuticos encontram-se as menores participações com, respectivamente, 13,6%, 14% e 16,3%.
Os números também mostram uma contundente diferença salarial entre os trabalhadores negros e não negros. A remuneração nominal média dos trabalhadores (as) negros (as) na indústria química do estado de São Paulo em 2014 foi de R$ 2.625,75, enquanto que a remuneração nominal média dos negros foi de R$ 4.414,75. Ou seja, um valor que corresponde a tão somente 59,5% da remuneração dos não negros. E quando utilizamos a remuneração média dos homens não negros do setor como paradigma, com os rendimentos da mulher negra, conseguimos identificar um cenário ainda mais desigual e desfavorável. Pois, a mulher não negra recebe em média 85,2% da remuneração do homem não negro, percentual que despenca para 60,4% quando comparamos a remuneração média dos homens negros com a dos homens não negros e, finalmente, e que atinge patamares desoladores ao mostrar que as mulheres negras recebem apenas 46,8% da remuneração dos homens não negros.
Os dados, que quando desagregados por ocupação, no que se refere ao exercício de cargos ou funções idênticas do processo produtivo, se tornam ainda mais desiguais. Ou seja, foram selecionadas 19 ocupações dentre as com maior volume de vínculos na indústria química, compreendendo assim 42,9% do total de trabalhadores do ramo industrial químicos em São Paulo. A mesma tendência de iniquidade foi observada pelo recorte ocupacional, onde, apenas em 03 ocupações a remuneração média dos negros se mostrou superior a dos não negros, sendo estas: Moldador de Plástico por Injeção, Trabalhador da Cultura de Cana-de-açúcar e Operador de Máquina de Produtos Farmacêuticos. A maior diferença salarial foi observada na ocupação de Supervisor Administrativo, na qual a remuneração média dos negros equivale a somente 66% da remuneração dos não negros, incluindo homens e mulheres.
A desigualdade se caracteriza principalmente, pela maior presença de negros em cargos, ocupações e setores onde existem as piores condições de trabalho, e com menor grau de qualificação, e que, em regra, apresentam menores salários e são os mais atingidos pela rotatividade de mão de obra.
O exame detalhado do mercado de trabalho da indústria química colabora com a inequívoca constatação de que o Brasil possui uma dívida histórica com a população negra. Dívida essa, que só faz perpetuar as discriminações e reproduzir desigualdades.
A superação da desigualdade racial exige medidas sólidas, sustentáveis e interligadas, que vão desde, a inserção mais consistente do acesso escolar e da permanência acadêmica, qualificação e requalificação profissional, como também o enfrentamento aos componentes ideológicos do racismo brasileiro. Pois, como visto, mesmo entre trabalhadores de um mesmo setor, que exercem a mesma ocupação, com o mesmo grau de escolaridade, a diferença salarial entre negros e não negros se apresenta evidente.
São dados que dão suporte a preocupação e reivindicações de um movimento sindical atuante, na luta cotidiana e continua pela promoção da igualdade racial no mercado de trabalho brasileiro. Sendo assim, todas essas informações deverão contribuir ainda mais como subsídio às futuras negociações coletivas pela implementação de cláusulas de combate à discriminação racial nos segmentos industriais químicas.
A FEQUIMFAR e seus Sindicatos filiados, com o apoio nacional da Força Sindical e da CNTQ, como também na esfera internacional, pela Industriall, reafirma o seu compromisso para que o quadro de desigualdade se reverta. E para que isso ocorra, não mediremos esforços, em apoio às iniciativas de nosso Departamento de Promoção da Igualdade Racial, na luta em defesa e por politicas públicas contra a descriminação, de incentivo a integração, e por uma sociedade mais justa e igualitária.
Sergio Luiz Leite, Serginho é presidente da FEQUIMFAR (Federação dos Trabalhadores nas Indústrias Químicas e Farmacêuticas do Estado de São Paulo), sendo também 1º Secretário da Força Sindical e membro do Conselho Deliberativo do FAT/MTE
Nota: Foram elencados os seguintes setores de atividade econômica para composição da indústria química em sentido amplo: álcool e biocombustíveis, adubos e fertilizantes, defensivos agrícolas, fibras artificiais e sintéticas, higiene pessoal perfumaria e cosméticos, produtos de limpeza, químicos para fins industriais, tintas e vernizes, produtos farmacêuticos, materiais plásticos e seus reciclados, brinquedos e instrumentos musicais.