A pandemia do coronavírus ainda tá longe de acabar, o crescimento esperado para 2021 mal coloca a economia no nível de 2019, a informalidade e o desemprego só aumentam, os preços não param de subir e os salários perdem poder de compra. Neste cenário desolador, o governo Bolsonaro/Guedes apresentou uma proposta de nova reforma trabalhista que liquida direitos dos trabalhadores.
A MP nº 1.045/2021, publicada no início de abril e já aprovada na Câmara, que relançou o Pemer – Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda e retomou a concessão do Benefício Emergencial (BEM) a trabalhadores que tenham a jornada de trabalho reduzida ou o contrato de trabalho suspenso em virtude da pandemia, sem modificar muito o programa em relação às edições anteriores, introduz uma série de modificações na legislação trabalhista com enormes prejuízos aos trabalhadores.
Dentre essas alterações, está a possibilidade de se realizar jornada complementar facultativa em atividades ou profissões com jornadas diferenciadas estabelecidas em lei. Esta medida incentiva a negociação individual entre patrão e empregado, flexibiliza ainda mais jornada de trabalho, e reduz o adicional de horas extras que atualmente é de 50%. A MP também trouxe uma série de exigências para que haja uma dupla visita do fiscal ao estabelecimento irregular, dificultando a fiscalização do local de trabalho.
A MP traz ainda dois programas, que com a justificativa de tentar reduzir o desemprego dos jovens e daqueles com mais de 55 anos e afastados do mercado de trabalho, precariza e fragiliza os postos de trabalho. São eles: o Requip – Regime Especial de Trabalho Incentivado, Qualificação e Inclusão Produtiva e o Priore – Programa Primeira Oportunidade e Reinserção no Emprego.
O Requip terá duração de três anos e seus potenciais beneficiários serão os jovens com idade entre 18 e 29 anos sem vínculo registrado em Carteira de Trabalho e Previdência Social há mais de dois anos e os oriundos de programas federais de transferência de renda (com família inscrita no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal – CadÚnico e renda mensal de até dois salários mínimos). O Programa oferecerá aos trabalhadores o “Bônus” de Inclusão Produtiva (BIP) de valor equivalente ao salário mínimo horário e correspondendo a um quarto das horas contratadas, limitadas a 11 horas semanais (1/4 da jornada normal de 44 horas). Levando-se em conta o valor horário do salário mínimo, de R$ 5,00 a hora, e uma jornada mensal de 44 horas semanais, o BIP poderá atingir R$ 275,00 por mês. Obviamente, o Bônus irá compor a remuneração do trabalhador não como um acréscimo, mas como substituto de parte do salário que normalmente lhe seria pago.
Já o Priori afetará diretamente o emprego de jovens e de pessoas com mais de 55 e prevê que o contrato de trabalho será firmado por prazo determinado, limitado a até 24 meses de duração e poderá ser assinado no período de até 36 meses a contar da publicação da lei. Esses contratos poderão ser utilizados para a admissão de trabalhadores com salários de até dois salários mínimos mensais para trabalho em qualquer tipo de atividade – transitória ou permanente, com exceção do trabalhador doméstico e safrista.
Importante destacar, que entre as várias questões colocadas pelo Priori, haverá a redução dos direitos trabalhistas favorecendo os empregadores: a alíquota dos depósitos do FGTS – Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, fixada em 8%, cai para 2% no caso das microempresas (receita bruta de até R$ 360 mil ao ano); para 4%, no caso das empresas de pequeno porte (receita bruta de até R$ 4,8 milhões ao ano); e para 6%, nos demais casos. Na linha da flexibilidade contratual, o pagamento do salário, do décimo terceiro salário proporcional e da gratificação de férias de 1/3 do salário será feito a cada mês ou em prazos até inferiores a um mês. Ademais, a multa rescisória obrigatória na dispensa sem justa causa será cortada pela metade, para 20% dos depósitos corrigidos, e um acordo individual poderá definir se essa multa será paga antecipadamente, juntamente com o salário, ou em depósitos mensais de 1,6% do salário.
Justificando a necessidade de incluir jovens no mercado de trabalho, o governo lança programas que aprofundam a desestruturação da legislação trabalhista, e que tem por trás a ideia de que pela flexibilização e precarização do trabalho é que surgirão novos empregos. Ao invés de garantir a estes jovens empregos de qualidade e protegidos aproveitando a janela de oportunidades brasileira, com a entrada de tantos jovens, a MP perpetua a inserção do jovem de maneira informal, em postos de baixa qualificação e sem direitos trabalhistas.
Patricia Pelatieri, economista, diretora técnica adjunta do Dieese