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1º de maio e suas memórias
quinta-feira, 28 de abril de 2011
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Em 1º de maio de 2011 chegamos ao 125º dia internacional do trabalhador. No centenário deste dia, no ano de 1986, o Centro de Memória Sindical, então com seis anos de existência, publicou o livro “1º de Maio cem anos de luta – 1886 – 1986”, escrito pelo senador italiano José Luiz Del Roio, que foi quem organizou, Archivio Storico del Movimento Operaio Brasilliano (ASMOB, sob custódia da Unesp/CEDEM).
Restam poucos exemplares desta obra rara, ilustrada com “precioso material sobre a luta do operariado brasileiro”.
No livro ele descreve a situação miserável em que viviam os trabalhadores no início do processo de industrialização na Inglaterra.
Dentre todas as barbaridades às quais o trabalhador era exposto, Del Roio destaca a pesada jornada de trabalho, que chegava a 80 horas semanais, sem qualquer regulamentação.
De fato, a Revolução Industrial (século XVIII) alterou profundamente a vida do trabalhador braçal. Os operários, inclusive mulheres e crianças, viviam em condições horríveis, em cortiços, com salários medíocres (no limite do nível de subsistência).
E a pesada jornada de trabalho acentuava estas condições. “Lazer, instrução e felicidade”, diz Del Roio, era algo com que os trabalhadores não tinham forças nem para sonhar. “Para eles, viver era não morrer”, conclui.
Isto posto, o escritor menciona, então, a formação das primeiras associações de trabalhadores, apontando o reconhecimento das Trade Unions (sindicatos), em 1824, na Inglaterra (que já existiam, mas só foram reconhecidas neste ano). Fala também da conquista da regulamentação da jornada de trabalho em 10 horas diárias para adultos, que passaou a vigorar em 1º de maio de 1848.
1848, inclusive, cita o livro, foi o ano do lançamento do Manifesto Comunista, escrito pelos célebres teóricos Karl Marx e Friedrich Engels. Com uma linguagem simples e acessível, o Manifesto, buscou conscientizar o operariado sobre a precariedade de sua situação e sobre sua importância como agente transformador da história. Desta forma, almejando organizar o proletariado como classe social, a obra tornou-se uma leitura instigante que, de fato, orientou os trabalhadores da época. Historicamente trata-se de um dos tratados políticos de maior influência mundial.
Na linha do lançamento do Manifesto Comunista, Del Roio, segue discorrendo sobre a formação de um centro de coordenação e informação para o proletariado de diferentes países. Segundo ele, em 28 de setembro de 1864, em Londres, foi realizado um encontro, inaugurado pelo próprio Karl Marx, que terminou com a fundação da Associação Internacional dos Trabalhadores (AIT), conhecida posteriormente como a Primeira Internacional.
Usando o exemplo da Revolução Industrial, o livro mostra, que o operariado, a partir da miséria que lhe foi imposta, sempre buscou se organizar e reagir às injustas sociais.
Desta forma, a adoção do 1º de maio como dia do trabalhador se consolida como um evento emblemático, que traz em si a ideia do grande potencial do povo em se unir e se organizar para reagir às adversidades.
Del Roio fala de como esta data foi estabelecida. Segundo ele, no bojo das contradições do capitalismo, no século XIX, se acirraram os conflitos entre trabalhadores e patrões. As jornadas de trabalho pesadas e em péssimas condições tornavam-se cada vez mais inaceitáveis e, quanto mais os trabalhadores se organizavam para reivindicar direitos sociais, mais violentas eram as repressões. Foi um período sangrento. Truculento.
Mas também de experiências e conquistas fundamentais para o futuro da classe trabalhadora.
Neste intenso contexto de lutas foram criadas, já nos Estados Unidos da América, de um lado o grupo auto-intitulado “Defensores da Ordem”, a serviço dos patrões, na repressão do movimento operário, e de outro os Cavaleiros do Trabalho (Knight of Labor), que existia desde 1869, mas fica mais forte em 1886, chegando ultrapassar 700 mil aderentes.
Além disso, em 1881 nasce a American Federation of Labor (AFL – que a partir da fusão com a CIO se transformou na atual AFL-CIO, Central Sindical do EUA), outra organização que reforçaria a luta operária.
Em 1884 a AFL promoveria um congresso em Chicago, no qual propõs um prazo – dentro do qual buscariam negociar e pressionar o governo e os patrões – para atingir o objetivo de estabelecer a jornada de trabalho em 8 horas diárias. Desta forma, se até o dia 1º de maio de 1886 tal meta não fosse atingida, a Federação propunha a realização de uma greve geral nacional. Aprovada por assembléia a proposta foi encampada pela AFL e pelos Cavaleiros do Trabalho, que passaram a se dedicar à mobilização de todas as categorias nos Estados Unidos.
Em abril de 1886, violentas greves despontaram em vários locais – muitas delas gerando boas negociações.
Eis que, como escreve Del Roio, “finalmente amanhece o 1º de maio de 1886”. Centenas de pessoas abandonam seus postos de trabalho. Há que se reconhecer que, entre o total de trabalhadores não foi a maioria que aderiu ao movimento. Entretanto, a força de seu simbolismo foi imensa. Segundo o autor “a história ainda não conhecera esse tipo de luta”, com vitórias consistentes.
A cidade de Chicago foi o coração do movimento. Não à toa. Chicago era, já naquela época, uma cidade que concentrava muitas indústrias, sendo uma espécie de “vanguarda do capitalismo americano”. Uma vez que estava à frente, do ponto de vista da produção capitalista, as contradições deste sistema, em contrapartida, estavam mais acirradas.
Aquele sábado, em 1º de maio de 1886, não foi um dia como os outros em Chicago. O silêncio da paralisação alastrou-se pelo ar. O era de tensão, e não de serenidade. E ele foi rompido pela grande passeata que atravessou a avenida Michigan e terminou com um eloqüente comício. A greve permaneceu por alguns dias. Ainda que pacífico, o movimento foi recebido com violência pela polícia, levando a mortes de trabalhadores, além da destruição de seus lares e de sedes de sindicatos. No dia 3 de maio, na frente de uma das fábricas, a polícia matou seis operários, feriu cinqüenta e prendeu centenas.
Atrocidades que se repetiram no dia seguinte, em outra grande manifestação.
Os principais líderes dos trabalhadores, Spies, Parsons, Engel e Fisher, foram condenados e executados em 11 de novembro de 1886.
Desta forma, cinco anos depois, no 2° Congresso da Segunda Internacional, em Bruxelas, foi aprovada a resolução de estabelecer 1° de MAIO, como o dia dos trabalhadores de todo o mundo.
Del Roio fala também, em grande parte do livro, sobre como o 1º de maio começou a ser comemorado no Brasil. Até as primeiras décadas do século 20, vivíamos uma condição de forte dependência econômica e social, e a população era predominantemente rural, não constituindo, desta forma, uma classe operária. De qualquer forma os primeiros sinais de comemoração do dia do trabalhador surgiram, ainda em 1895, na cidade de Santos (SP) e há registros de manifestações no 1º de maio, nas cidades de São Paulo, Santos, Jundiaí, Campinas e Ribeirão Preto, em 1898. Mas o dia do trabalhador viria a ser oficializado, sendo feriado nacional, já na época de Getúlio Vargas – período de massiva industrialização, desenvolvimento e urbanização do Brasil.
Por fim, o livro reflete sobre como o 1º de maio evoca ao mesmo tempo “velhas tradições, festas e lutas”. Data em que a classe trabalhadora revela sua cultura, sua força e seu poder. Referindo-se aos vários jornais, cujas capas são reproduzidas no livro, ele fala que “nos 1ºs de maio, os jornais da imprensa proletária, geralmente muito pobres, sempre se esforçavam para sair bonitos, com iconografia que requeriam considerável esforço técnico. Chegavam até mesmo a editar jornais em cor vermelha, uma verdadeira obra prima para a época”.
Milton Batista, Cavalo é Presidente do Centro de Cultura e Memória Sindical e Secretario de Cultura e Memória da Força Sindical.