A matriz energética brasileira é altamente concentrada nas usinas hidrelétricas, o que impõe grande vulnerabilidade à economia do país em períodos de estiagem prolongada. O baixo volume de chuvas no chamado período úmido (outubro a março) ou a seca prolongada para além do período de estiagem (abril a setembro), com a consequente redução dos níveis de rios, represas e reservatórios, ameaçam a capacidade do país produzir energia elétrica suficiente para a atividade industrial ou mesmo para o consumo da população em geral.
Porém este não é um problema exclusivo dos “céus” – ou da indisposição de São Pedro guardião da chuva –, a situação crítica em que se encontram os reservatórios é resultado da falta de planejamento do governo federal, somado à ausência de políticas ambientais e de fiscalização do desmatamento nas regiões pantaneiras e amazônicas. Com a política de destruição ambiental ou a política de “passar a boiada”, nas palavras do próprio Ricardo Salles (ex-Ministro do Meio Ambiente investigado por retirada e venda ilegal de madeira), o governo Bolsonaro foi capaz de em menos de 3 anos ameaçar pôr o Brasil no escuro.
O nível de armazenamento dos principais reservatórios do país localizados nas regiões Sudeste e Centro-Oeste está atualmente em 17,5%, bastante abaixo dos níveis de 2001 (ano do famoso “apagão”) quando o volume destes mesmos reservatórios estava em 26,8%. Segundo o próprio Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), é possível que o sistema chegue ao nível de 10% com perda do “controle técnico”.
A atual crise hídrica tem reduzido a oferta de produtos agropecuários destinado às famílias e pressionado a inflação de alimentos, o que afeta sobretudo a classe trabalhadora e as populações mais vulneráveis. A miséria no país tem feito crescer a procura por restos de carcaças (“Caminhão de ossos no Rio é disputado por população com fome”, Folha de S. Paulo em 29/09). Enquanto a inflação geral medida pelo IPCA nos últimos doze meses já ultrapassa os 10%, a inflação de alimentos para o mesmo período está em 13,9% e o aumento da energia elétrica residencial foi de 21%. Para compreender as causas desta grave situação precisamos olhar com um pouco mais de cuidado para todo esse cenário.
Esta conjuntura estimula a queimada e o desmatamento de novas áreas para a expansão do agronegócio, agravando o cenário descrito e dificultando a formação dos chamados “rios voadores”, que levam chuvas para o restante do país ao longo do ano. Uma das principais causas para o baixo nível dos reservatórios decorre da política de “exportação de água” na forma de commodities, conformando um verdadeiro ciclo predatório que se agrava ano após ano. Finalmente, não tendo água nos rios e reservatórios, não temos energia elétrica, sem energia a indústria não produz e sem produção não há contratação, não há pagamento de salários, tampouco consumo.
A falta de planejamento, a política de destruição ambiental para favorecimento do agronegócio e a visão absolutamente limitada da integração econômica intersetorial, colocam novamente o país como refém de um governo despreparado. A resposta demagógica do governo Bolsonaro tem sido “tome banho frio, evite elevadores”, enquanto na prática privatiza a Eletrobras em uma verdadeira política de saque do patrimônio público e avança na destruição dos recursos naturais. As próximas crises hídricas e energéticas estão sendo hoje agravadas, estreitando ainda mais os gargalos estruturais da indústria de transformação brasileira, assim como a situação de vulnerabilidade da população em geral.
Sergio Luiz Leite, Serginho
Presidente da FEQUIMFAR e 1º secretário da Força Sindical