
Pedidos de demissão batem recorde em 2024
Em 2024, o Brasil registrou um número recorde de pedidos de dispensa voluntária, totalizando quase 8,5 milhões de trabalhadores (as) que optaram por deixar seus empregos.
Esse aumento é atribuído a um mercado de trabalho aquecido, que oferece novas oportunidades e incentiva profissionais a buscar melhores condições ou novos rumos. No entanto, também reflete um crescente descontentamento com as condições de trabalho.
Em 2022, o Brasil registrou aproximadamente 6,8 milhões de pedidos de demissão voluntária, representando 33,6% dos 20,2 milhões de desligamentos no mercado formal.
Em 2023, esse número aumentou para cerca de 7,3 milhões, correspondendo a 34% dos 21,5 milhões de desligamentos. Esses dados contrastam com as tendências anteriores à pandemia, quando o percentual oscilava em torno de 25%.
Esse crescimento reflete mudanças nas expectativas dos trabalhadores e trabalhadoras, bem como nas condições e oportunidades do mercado.
Com base nos dados do CAGED para 2024, extraídos pelo CESIT/UNICAMP, este artigo analisa o perfil das pessoas que pediram demissão, os setores mais afetados e os fatores que impulsionam essa tendência. Entender esses movimentos é essencial para compreender as dinâmicas do mercado de trabalho.
Os desligamentos a pedido representam uma parcela significativa do total de desligamentos. Em 2024, 35% dos desligamentos foram voluntários, demonstrando um crescimento em relação a anos anteriores.
Esse aumento pode estar relacionado a fatores como insatisfação salarial, busca por melhores condições de trabalho ou novas oportunidades no mercado.
Os pedidos de demissão ocorrem predominantemente em empregos de baixa remuneração. Cerca de 57% dos trabalhadores que pediram demissão em 2024 ganhavam entre 1,0 e 1,5 salário mínimo, sugerindo insatisfação com os baixos salários e a falta de perspectivas de crescimento profissional.
Além disso, também se identificou uma relação entre carga horária extensa e a decisão de pedir demissão. Em 2024, 80% dos pedidos vieram de trabalhadores com jornadas entre 44 e 47 horas semanais, indicando que o equilíbrio entre vida pessoal e profissional é uma questão cada vez mais relevante.
A faixa etária também é um fator determinante. Em 2024, 68% das demissões voluntárias ocorreram entre trabalhadores de 20 a 39 anos. Jovens entre 17 e 29 anos apresentaram uma taxa de desligamento a pedido superior à média, refletindo maior mobilidade no mercado e a busca por condições mais favoráveis.
Entre esses jovens, o discurso do empreendedorismo desempenha um papel relevante. Muitos veem nos empregos por aplicativos ou plataformas digitais uma promessa de maior autonomia e controle sobre seu tempo.
No entanto, essa percepção mascara a precarização das relações de trabalho, com rendimentos instáveis e falta de direitos trabalhistas, alimentando um ciclo de precariedade e vulnerabilidade social.
O nível educacional também tem um impacto significativo nos pedidos de demissão. Em 2024, 64% dos (as) trabalhadores (as) que pediram demissão tinham ensino médio completo, enquanto 11% possuíam ensino superior completo.
Isso sugere que pessoas com maior escolaridade se sentem mais confiantes para buscar novas oportunidades, enquanto aquelas com menos qualificação enfrentam mais dificuldades para trocar de emprego.
Os setores com maior número de desligamentos a pedido foram:
- Comércio, Reparação de Veículos Automotores e Motocicletas: 2.251.340 desligamentos voluntários (26,4% do total de pedidos);
- Atividades Administrativas e Serviços Complementares: 1.360.343 desligamentos voluntários (16,0%);
- Indústrias de Transformação: 1.288.849 desligamentos voluntários (15,0%).
A ocupação com maior número de desligamentos a pedido foi a de vendedor de comércio varejista (461 mil), representando 38,5% do total de desligados nesta função. As ocupações com maiores proporções de demissões voluntárias foram:
- Operador de Telemarketing Ativo e Receptivo: 55,7% dos desligamentos foram a pedido;
- Atendente de Lanchonete: 49,8%;
- Operador de Caixa: 47,2%;
- Repositor de Mercadorias: 46,2%;
- Auxiliar nos Serviços de Alimentação: 43,7%.
Os pedidos de demissão em 2024 refletem um mercado dinâmico, no qual trabalhadores (as) buscam melhores condições e oportunidades, mas também apontam para problemas estruturais, como baixa remuneração, jornadas extensas e falta de perspectivas de crescimento.
O setor de comércio é um dos mais afetados, e o fenômeno levanta questões importantes sobre as condições de trabalho no país. Compreender essas dinâmicas é fundamental para o desenvolvimento de políticas públicas que abordem esses desafios e garantam melhores condições para a classe trabalhadora.
Marilane Oliveira Teixeira é Economista, doutora em desenvolvimento econômico e social, professora e pesquisadora do CESIT na área de trabalho, relações de trabalho, gênero e sindicalismo