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Curitiba (PR): A vida curta do pleno emprego
segunda-feira, 6 de junho de 2011
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A região de Curitiba registra a menor taxa de desemprego do país, mas fenômeno corre o risco de desaparecer em breve devido à falta de investimentos
Publicado em 05/06/2011 | João Pedro Schonarth
Fale conoscoRSSImprimirEnviar por emailReceba notícias pelo celularReceba boletinsAumentar letraDiminuir letraA melhor notícia que o mercado de trabalho deu à região de Curitiba nos últimos 12 meses vive o risco de desaparecer tão rapidamente quanto veio: o status de região com “pleno emprego” – ou seja, com menos 5% de sua população economicamente ativa desempregada – não vai se sustentar no longo prazo sem investimento pesado em educação, qualificação profissional e redução das desigualdades sociais.
Desde junho do ano passado, a região metropolitana da capital crava as menores taxas de desemprego do país – a última medição, feita em abril pelo Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social (Ipardes), apontou um índice de 3,7%. Isso significa que apenas 59 mil, de seus 1,59 milhãos de trabalhadores ativos, estão parados.
Saiba mais
Veja dados sobre a taxa de desemprego na região metropolitana de Curitiba ”Fora da estatística”
Desempregados lutam para conseguir vaga
As dificuldades do dia a dia de um profissional sem trabalho não são medidas pelas estatísticas. A técnica em química Cléia Aparecida de Oliveira é um desses casos: mesmo tendo qualificação profissional e experiência na área, ela não encontra uma vaga há um ano – apesar de, pelas suas contas, já ter distribuído mais de cem currículos para as mais diferentes empresas e agências de trabalho. “Neste tempo todo não fui convidada nem para uma entrevista. A gente ouve que o mercado de trabalho está em busca de pessoas qualificadas e eu me encaixo nesse perfil, mas não encontro nada. Sabendo que o desemprego em Curitiba é tão baixo eu me sinto péssima, desmotivada e desvalorizada. Parece que todo mundo consegue, menos eu”, lamenta.
Enquanto trabalhava, Cléia fazia um curso superior em Engenharia da Produção, mas devido à demissão teve de trancar a matrícula. Mesmo assim, buscou nesse período que está em casa outros cursos para melhorar sua qualificação. “Já fiz curso de mecânica básica, para tentar entrar na indústria de metalurgia, e de informática. Queria fazer inglês, mas não tenho dinheiro. Por sorte meu marido está trabalhando e ainda tenho o dinheiro da minha rescisão. Mas vai durar no máximo mais cinco meses. É o meu limite”, diz.
Otimismo
O tecnólogo em logística Kahoê Mudry também está desempregado, mas está otimista em encontrar uma vaga. “O curso superior nessa área é só um pré-requisito, preciso conhecer outras ferramentas e aperfeiçoar um segundo idioma. Como a taxa de desemprego está baixa e o setor precisando de profissionais, acho que quando começar a procurar de verdade vou encontrar um emprego”, analisa.
Contrapontos
A situação de pleno emprego traz vantagens e desvantagens para a região. Veja quais são:
Vantagens
• Um contingente maior de trabalhadores significa mais pessoas podendo consumir, o que é bom para elas e para o local onde gastam o dinheiro. Um aumento no pessoal ocupado implica em um incremento na massa salarial, o que é um estímulo para a produção. Um consumo maior faz com que as empresas tenham que produzir mais e para isso há a necessidade de mais contratações. “É um círculo virtuoso, com impacto positivo sobre a dinâmica da economia”, salienta o professor Amilton José Moretto, da Unicamp.
• Uma situação de pleno emprego fortalece a organização e a negociação dos sindicatos, que encontram um ambiente mais favorável para fazer cumprir condições de trabalho e avançar em direitos para os trabalhadores. “Com desemprego alto, é muito mais difícil esta negociação”, explica o professor.
• Com crescimento da economia há uma arrecadação fiscal muito maior, já que as empresas tendem a formalizar os empregados. “A arrecadação é maior mesmo que não haja a criação de novos impostos”, afirma o pesquisador.
Desvantagens
• Em alguns setores da economia de pleno emprego pode haver apagão de mão de obra, devido ao aumento de número de vagas e à falta de trabalhadores para elas – seja por inexistência de demanda ou por causa da baixa qualificação dos empregados. Com menos trabalhadores disponíveis, as empresas terão de pagar mais caro para atrair profissionais. “Entretanto, essa seria uma maneira de revitalizar cursos em que não havia grande procura no passado. Seria um impacto sobre a educação”, avalia Moretto.
• Com muitas pessoas empregadas, há dificuldade de mobilidade no mercado de trabalho, já que as vagas estariam quase todas preenchidas e os profissionais não poderiam encontrar novas oportunidades. “Por isso nem é bom reduzir o desemprego a zero”, ressalta.
• Segundo o professor da PUCPR Marciano de Almeida Cunha, o brasileiro apresentou um aumento do nível de escolaridade nos últimos anos e por isso deseja agora postos mais elevados. Com isso, as vagas que requerem menos qualificação ficam ociosas, como as de caixa de supermercado e atendente de lanchonete.
• O baixo nível de desemprego de uma localidade pode atrair mão de obra desqualificada de outras regiões e esse fluxo migratório costuma impactar no planejamento urbano da cidade, segundo Cunha.
O pleno emprego é uma novidade em um país que há poucos anos celebra altos níveis de crescimento econômico. A expressão precisa ser melhor compreendida, principalmente porque quase sempre é apresentada como triunfo das políticas públicas de geração de postos de trabalho.
Do ponto de vista técnico, ter baixíssimo índice de desemprego nas curvas da estatística não significa que todos os trabalhadores de uma localidade estejam empregados, mas implica em uma situação em que há uma taxa de desemprego de “equilíbrio” – esse seria o índice de 5%, segundo economistas.
Esse equilíbrio ocorreria quando o nível de trabalhadores desempregados estivesse em uma faixa considerada como “friccional”. Nela, as pessoas que procuram emprego ficam um período entre 30 e 60 dias fora do mercado de trabalho. O Ipardes usa a mesma metodologia do IBGE, considerando o número de pessoas com mais de 10 anos de idade que procurou colocação nos últimos 30 dias para calcular a taxa de desemprego.
“O fato de a região metropolitana de Curitiba ter apresentado nos últimos meses um desemprego abaixo do 5% mostra que a economia tem um certo dinamismo. As pessoas que vêm buscando empregos têm encontrado. Não há excesso de oferta de mão de obra nem déficit de vagas de trabalho. Para manter este equilíbrio, é preciso uma política social que garanta redistribuição de renda”, explica Amilton José Moretto, professor do Instituto de Economia da Unicamp e pesquisador do Centro de Estudos Sindicais e Economia do Trabalho (Cesit).
Apesar de a taxa de desemprego na Grande Curitiba ser mais baixa do que em muitos países industrializados (veja ao lado os países com desemprego abaixo de 5%, segundo o Fundo Monetário Internacional), há um grande abismo entre a situação brasileira e a de nações desenvolvidas.
“Temos um suposto pleno emprego, pois não houve nem no Brasil nem na RMC um aumento significativo em investimentos. Para termos uma situação real de pleno emprego precisamos de investimentos em educação e qualificação profissional, flexibilização da carga tributária e principalmente uma proteção social maior”, afirma o presidente do Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social (Ipardes), Gilmar Mendes Lourenço.
O economista, que responde por um dos principais organismos de planejamento da economia do Paraná, é taxativo: “Enquanto o setor público não promover serviços sociais adequados, continuaremos apenas tendo uma estatística baixa, mas que não representará a realidade. O pleno emprego sem mudanças estruturais pode ser apenas um dado pontual e transitório, que desaparece tão rápido quanto apareceu”.
Para o professor Marciano de Almeida Cunha, especialista em administração da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), é possível que a taxa de desemprego no Brasil se estabilize em índices de pleno emprego pelos próximos 5 anos. “Isso é um reflexo das políticas econômicas da primeira década dos anos 2000, não é de hoje. Por causa dos investimentos dos últimos dez anos, podemos ter mais cinco anos de estabilidade. Mas é preciso uma distribuição de renda melhor e mais qualidade nos empregos, para dar sustentação a esse equilíbrio”, pondera.
Qualificados fora do mercado chegam a 1 mi
Apesar da taxa de desemprego estar em patamares recordes no Brasil, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) calcula que mais de 1 milhão de trabalhadores com experiência e qualificação profissional permanecerão desempregados no país, mesmo com o incremento dos postos de trabalho durante o ano.
No Paraná acontece o mesmo: segundo o estudo, 12,4 mil paranaenses com qualificação e experiência ficarão desempregados porque diversas empresas não conseguem absorver esses profissionais.
Ao mesmo tempo, há setores da economia paranaense que devem sofrer com a falta de trabalhadores. Na indústria, 18,5 mil vagas devem ficar ociosas, enquanto nos transportes, armazenagem e comunicação (logística), serão 3,4 mil postos.
Para que haja mudanças estruturais na sociedade brasileira e para que o pleno emprego se mantenha em definitivo no mercado de trabalho, há necessidade urgente, segundo o presidente do Ipardes, Gilmar Lourenço, de se investir em educação, do ensino básico ao superior.
“Precisamos ampliar o nível de escolaridade dos brasileiros, que hoje está em torno de 7,5 anos de estudo, enquanto os países desenvolvidos têm o dobro disso. Precisamos valorizar os professores e incentivar os jovens a estudar mais. Em relação ao emprego, é necessário que os estudantes do ensino médio e superior tenham uma formação mais técnica. É preciso investir neste nível de qualificação, para não termos profissionais tão generalistas, mas com conhecimento profundo em sua área de atividade”, explica.