Há, persistente, uma contradição: todos exaltam o papel positivo do auxílio emergencial de 600 reais mas quase ninguém luta por seu pagamento até dezembro.
Com a exceção reconhecida das centrais sindicais que levantaram esta bandeira ainda no auge da pandemia e a mantém até hoje e de alguns deputados que a defenderam em suas redes sociais e em suas ações parlamentares, ninguém mais se empenhou com presteza e urgência para sua manutenção.
Caiu sobre o tema um espesso silêncio, às vezes disfarçado pela algaravia sobre um auxílio emergencial futuro. Mesmo o presidente da República (prestigiado pelo benefício) foi induzido a cortar pela metade seu valor desde já, o que lhe deve causar arrependimento – se é que pretende, como parece, buscar o caminho do eleitorado pobre e paupérrimo.
Com as eleições municipais atraindo as atenções, o Congresso Nacional em recesso branco e com o desmanche acelerado das relações de trabalho (o desemprego, a informalidade, o desalento explodem) o movimento sindical, que ainda luta contra a MP 1.000 e pelos 600 reais tem que se preocupar com outros temas imediatos e relevantes. É a vida que segue, apesar da pandemia.
Uma lição, pelo menos, pode se extrair de tudo isso.
Na enorme confusão causada pela doença e pela infeliz situação de milhões de pessoas, levará algum tempo para que bandeiras populares se materializem em ações efetivas e eficientes. Há o risco de que, passadas as eleições, aconteçam explosões de insatisfação popular quando se fizerem sentir os efeitos negativos da quebra de recursos, do desemprego, da carestia e da falta de orientação política oposicionista.
Esta lição tem que ser levada em conta na própria ação sindical permanente, já que o dia a dia dos empregados formais (representados pelos sindicatos) não é imune a esta situação desorganizadora, exigindo esforço unitário redobrado das direções sindicais para enfrentá-la.
João Guilherme Vargas Netto
É membro do corpo técnico do Diap e consultor sindical de diversas entidades de trabalhadores em São Paulo