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Memória Sindical
O suicídio de Getúlio Vargas
terça-feira, 12 de agosto de 2014
Memória Sindical
Arquivo FGV
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Multidão acompanha o cortejo de Vargas no Rio de Janeiro
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No dia 24 de agosto de 1954, portanto há 60 anos, o presidente Getúlio Vargas se suicidou. Em seus últimos dias de vida ele foi atormentado por uma pressão exacerbada por parte do Exército, do Congresso Nacional e da imprensa. Seu suicídio causou grande comoção popular, repercutindo nas forças políticas da época. Segundo historiadores, com esta atitude drástica ele conseguiu adiar por dez anos um golpe militar que poderia ter eclodido em 1954.
Getúlio Vargas foi um presidente ambíguo. Mas podemos compreendê-lo se levarmos em conta a situação internacional na qual se desenvolveu seu governo. Ele assumiu a Presidência do Brasil por meio do golpe de Estado conhecido como “Revolução de 30”, em meio às tensões sociais e políticas do período entreguerras (1918 a 1939).
Neste contexto, marcado pela Grande Depressão, pela emergência do socialismo soviético e pela ascensão do nazismo e de regimes totalitários, Getúlio instituiu um regime fascista e anticomunista, conhecido como Estado Novo (1937 a 1945). Foi nesse período que ele lançou as bases fundamentais para a regulamentação das relações de trabalho, das quais a maior parte vigora até hoje.
O Estado Novo terminou no mesmo ano em que acabou a II Guerra Mundial, com a derrota da Alemanha nazista, em 1945. Os novos tempos pediam governos mais democráticos e economicamente mais liberais. E Getúlio, eleito presidente da República em 1950, acompanhou as mudanças que se apresentavam.
No início de seu novo governo, o alto custo de vida que assolava os trabalhadores gerou uma onda de manifestações sindicais. A Greve dos 300 mil, de março de 1953, a maior dessas manifestações, teve como desdobramento o reajuste do salário mínimo em 100%. O reajuste foi anun-ciado pelo ministro João Goulart e assinado pelo presidente Vargas no dia 1º de maio de 1954, sob um clima de tensão entre governo, empresários e trabalhadores.
A tensão no governo se agravaria ainda mais após um episódio conhecido como o atentado da Rua Toneleiros, em 5 de agosto de 1954. No episódio, o major Rubens Florentino Vaz, da Força Aérea Brasileira (FAB), foi morto a tiros em frente à residência do deputado federal, forte opositor de Getúlio, Carlos Lacerda. Seguiu-se ao caso uma forte suspeita de que o ataque destinava¬-se, na verdade, a Lacerda. E com a descoberta de que os autores do crime, Alcino João Nascimento e Climério Euribes de Almeida, eram membros da guarda oficial, as suspeitas recaíram sobre o próprio presidente.
Com isso ele foi pressionado pela imprensa e por militares a renunciar. Em sua última reunião, em 23 de agosto, os minis¬tros não apresentavam alternativa à crise políti¬ca, articulando, por trás dos acontecimentos, a instauração de uma ditadura militar. Naquele dia Getúlio fez o seguinte registro em sua agenda: “Já que o Ministério não chegou a uma conclu¬são, eu vou decidir: determino que os ministros militares mantenham a ordem pública. Se a or¬dem for mantida, entrarei com pedido de licen¬ça. Em caso contrário, os revoltosos encontrarão aqui o meu cadáver”. E, na madrugada de 23 para de agosto de 1954, se suicidou com um tiro no peito.
No dia 24 sua carta-testamento, endereçada ao povo brasileiro, foi lida pelas rádios. As últimas palavras de Getúlio Vargas, inscritas na carta, tor¬naram-se parte emblemática da história do País:
“E aos que pensam que me derrotaram res¬pondo com a minha vitória. Era escravo do povo e hoje me liberto para a vida eterna. Mas esse povo de quem fui escravo não mais será escravo de nin¬guém. Meu sacrifício ficará para sempre em sua alma e meu sangue será o preço do seu resgate. Lutei contra a espoliação do Brasil. Lutei contra a espoliação do povo. Tenho lutado de peito aberto. O ódio, as infâmias, a calúnia não abateram meu ânimo. Eu vos dei a minha vida. Agora vos ofereço a minha morte. Nada receio. Serenamente dou o primeiro passo no caminho da eternidade e saio da vida para entrar na História”.
O povo, então, tomou as ruas do Brasil mani¬festando pesar pela morte do presidente, e in¬dignação e revolta contra seus adversários. O ce¬nário transformara-se completamente. O clima para a deflagração do golpe, que antes fervilhava na alta cúpula, esfriara por completo. Muitos his¬toriadores afirmam que o suicídio de Getúlio Var¬gas adiou um golpe militar que pretendia depô¬-lo. E ainda que, na esteira de sua popularidade, foi possível eleger os presidentes Juscelino Ku¬bitschek (1965) e João Goulart (1961).
*Carolina Maria Ruy é jornalista, coordenadora de projetos do Centro de Cultura e Memória Sindical