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Criança e Adolescente
Rio Branco (AC): TRABALHO INFANTIL: Crianças trocam as brincadeiras pelo trabalho na Capital
segunda-feira, 19 de abril de 2010
Criança e Adolescente
Apesar de o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) proibir qualquer trabalho a menores de quatorze anos - salvo na condição de aprendiz - meninos e meninas com idades entre oito e doze anos, foram flagrados por esta GAZETA auxiliando seus pais na venda de doces e salgados dentro do Terminal Urbano de Rio Branco.
O ECA prevê expressamente que nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. Sendo dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação desses direitos.
Todavia, os registros foram feitos em horário noturno, entre 19h e 22h, depois de três semanas de observação, demonstram que se trata de uma prática corriqueira, que vem sendo ignorada pela administração do Terminal, por poli-ciais, fiscais e os mais de vinte mil usuários do sistema de transporte coletivo que passam diariamente pelo local.
As crianças começam a chegar ao cair da noite e se demonstram totalmente ambientadas com a rotina. Pagam a passagem, passam a roleta e naturalmente se juntam a seus pais, que já se encontram lá. Não há tempo para beijos nem abraços, assumem rapidamente seus postos de trabalho e dão início a árdua missão de contribuir com o sustento da família.
Abordadas pela Reportagem por que estavam ali e se não se importavam de trabalhar como adultas, as crianças responderam que tudo era muito “divertido” e que não tinha perigo porque seus pais a observavam de longe. Apesar da revelação, a maior parte do tempo eles ficam sozinhas, chegando a se confundir com meninos e meninas sem lar.
As condições de trabalho são insalubres e arriscadas. Ora ficam sentadas, quietinhas a espera dos clientes. Noutras perambulam pelas plataformas, carregadas de sacos de banana frita ou pequenas bacias recheadas de guloseimas, sem se dar conta do perigo que as cerca.
Não bastasse, são alvo de insultos e gozações por parte de jovens – muitos até fardados – que utilizam o Terminal Urbano de Rio Branco como ponto de encontro, onde as “tribos” apresentam maneiras diferentes de diversão e satisfação.
No período de observação, equipe de A GAZETA se misturou a multidão e não teve qualquer dificuldade em efetuar os registros, o que constitui falha grave por parte da segurança, diante do pânico coletivo por conta das constantes notícias de desaparecimento de crianças e adolescentes.
A Polícia Militar até que realiza patrulhas diárias dentro do Terminal, o problema é que elas só ocorrem à luz do dia. Ao cair na noite, os PMs desaparecem e não demora muito para o local se transformar em cenário de desrespeito aos direitos da criança e do adolescente.
No final de semana, o endereço do descaso é a Praça da Revolução
A utilização da mão-de-obra infantil pela própria família não se restringe ao Terminal Urbano da Capital. No final de semana, o endereço da exploração é a Praça da Revolução, freqüentada por políticos, secretários de Estado, gestores públicos, membros do Judiciário, e localizada defronte ao quartel da Polícia Militar.
Lá, também encontra-se crianças auxiliando seus pais na venda de balões e brinquedos. A diferença é que elas realmente parecem se divertir, afinal estão em ambiente agradável, cercadas de algodão-doce, sorvete, pipoca, e todas essas coisas que fazem uma criança se sentir especial.
O problema é a vulnerabilidade que elas estão sujeitas. Por melhores que sejam as intenções dos pais, um simples descuido pode ser fatal. O que parece uma diversão entre pai e filho pode se transformar em tragédia.
Também há crianças completamente desacompanhadas. Algumas chegavam a desaparecer meio aos muitos balões que carregavam. Elas chegam ao entardecer e permanecem na praça até venderem toda mercadoria.
A maioria é oriunda de bairros próximos ao centro da cidade, como Preventório, e ingressam no mercado de trabalho por orientação dos próprios pais ou de terceiros. Em algumas situações, a exploração é tão cruel que eles recebem apenas alguns trocados pelas vendas que realizam.
Superintendência da Rbtrans já emitiu alerta para as autoridades
Procurada por A GAZETA, a administradora do Terminal Urbano de Rio Branco, Cássia de Souza Pessoa, informou por telefone que as explicações a respeito da exploração do trabalho infantil no local deveriam ser buscadas junto ao Superintendente de Transporte e Trânsito da Capital, Ricardo Torres.
Para a reportagem, Torres disse que tem conhecimento da problemática e que já emitiu alerta às autoridades encarregadas de garantir a proteção dos direitos da criança e do adolescente. Segundo ele, ofícios foram emitidos às polí-cias Civil, Militar, Conselho Tutelar da Criança e do Adolescente e à Promotoria de Defesa da Criança e do Adolescente do Ministério Público do Estado (MPE).
De acordo com Torres, a própria administração do Terminal comunicou o fato à Rbtrans, com base em imagens registradas pelas câmeras instaladas na área. “Tudo foi documentado e encaminhados às autoridades responsáveis pelas questões relacionadas à criança e ao adolescente”, disse.
Ele assegura que as polícias Militar e Civil têm colaborado bastante, mas que infelizmente as ações ainda são insuficientes para resolver de dez à questão. A Rbtrans também solicitou a intensificação do trabalho dos fiscais da prefeitura, o conhecido “Rapa”, que acabou por coibir a exploração do trabalho infantil durante o dia.
O problema é que eles passaram a agir à noite. “Veja que enquanto o Rapa e as polícias estão no local não se registra fatos desse tipo. Mas infelizmente eles aproveitam a ausência da fiscalização no horário noturno para agir clandestinamente”, disse Ricardo.
Adolescentes eram utilizados pelo tráfico
Ricardo Torres revelou ainda que a problemática dentro do Terminal Urbano de Rio Branco vai além da exploração do trabalho infantil. Foi constatado que adolescentes eram utilizados para vender droga. “Eles utilizavam ba-cias de bombons para esconder a droga. Pedimos a ajuda da polícia e conseguimos coibir”, assegura.
Os ambulantes que atuam no local agem de forma irregular. Segundo Torres não existe concessão por parte da prefeitura para a exploração do serviço, por isso o Terminal acaba sendo alvo de todos os tipos de oportunistas.
No caso dos adolescentes que estavam a serviço do tráfico, eles entravam com suas mercadorias dentro das mochilas e disfarçadamente repassavam aos usuários como se estivessem vendendo bombons. “Ficamos sabendo disso ao coibir o trabalho ilegal. Agimos administrativamente a acabamos acertando algo maior”, disse Torres.
A Rbtrans também está preocupada com a grande concentração de jovens no terminal. Eles aproveitam os finais de tarde para promover baderna dentro e fora do local. Muitas reclamações já foram feitas à administração e as providências estão sendo adotadas.
Um comunicado também já foi feito pela Rbtrans à Polícia Federal acerca da ação de peruanos e bolivianos. Eles atuam geralmente nos finais de semana, revendendo produtos contrabandeados de seus países.
Reunião vai discutir medidas
Torres informou também que na última quinta-feira (15), por provocação da Rbtrans, representantes de órgãos ligados à questão da infância e da adolescência se reuniram no MPE, para discutir medidas mais efetivas para combater a situação.
Na oportunidade, novos relatórios foram entregues à Promotoria da Infância e da Adolescência. Depois de muita discussão, os participantes os presentes se comprometeram em participar de nova reunião nesta semana para definir um plano de ação.
“A Dra. Kátia Guimarães é uma pessoa muito comprometida com a situação da infância e da adolescência. É importante que se diga que temos conhecimento da situação e estamos agindo de forma a dar uma solução definitiva”, garantiu.